quinta-feira, 13 de novembro de 2008

FOGO


É. Fogo. E o que ardeu fui eu.

Se me lembro, não. Sei que me levantei do sofá onde dormia e tentei fugir. Só porque os bombeiros contaram que eu caí já perto da porta de saída. Sei que tive queimaduras de 2º e 3º graus. A percentagem do corpo queimada... já não me lembro.

Mas tenho um diário escrito pela Irmã da minha Alma. Tenho que o procurar. Não está neste computador.

Mas é aí que o meu marido não foi mau. Estava lá TODOS os dias. Sei disso apesar de ter estado em coma induzido durante os primeiros tempos.

Não sei as datas.

Sei que adormeci calmamente em casa de uma "amiga" a 24 de Setembro. E calma porque o meu marido me JUROU que não me ía mais tirar, ou tentar tirar, a nossa filha.

Lembro-me de pensar, depois desse dia passado na praia que, finalmente, podia respirar fundo.

E respirei. E adormeci tranquila.

Não me lembro do dia 25. Sei que alguém passou na rua, que esse alguém viu muito fumo, que esse alguém chamou os bombeiros, que estavam mesmo ao lado.

A esse alguém, devo a vida. Quem é? Nunca soube.

Fiquei internada no hospital, na Unidade de Queimados. E o meu marido foi lá TODOS os dias. Eu tinha as mãos queimadas, portanto, cheias de ligaduras. Tive até que ser operada à mão esquerda.

Mas não me lembro!

A morfina fz maravilhas, verdade! E, nestes casos, tem mesmo que ser.

Mas todos os dias ele me ía dar o jantar. Não falhou um.

Antes disso, viviamos com a minha mãe, nos arredores de Lisboa. Durante o tempo em que estive internada, ele mudou de casa. Veio para Lisboa, onde estou agora, neste monte de betão.

Já lá vão três anos.

A minha mãe aguentou dois anos com assitência social, teve que ir mais um para um lar e morreu.

Lembrou-me desse homem "doce" (magoado, sim, que eu depois conto) dizer ao psiquiatra do hospital que eu era bipolar e que ía ficar a viver sozinha, que tinha de tomar conta da minha mãe... Lembro-me que ele me levava a minha filha para me ver ao sábado ou ao domingo.

Ai! E como me lembro dos gritos dela quando tinha que me deixar!!!!

Foi "boa pessoa"? Não! Foi vingativo, mesquinho, de carácter pobre...

Acabei por vir para aqui. Para este betão.

Mas estou com a minha filha e só isso me interessa! Acho que ele me disse para vir porque já nem ele aguentava os gritos dela quando se separava de mim. Ou talvez não.

Sei porque é que ele me acompanhou sempre no hospital.

O que gritei com ele por não ir ver a primeira mulher, quando ela esteve também ali, mas em psiquiatria. Ele não a ía visitar!

Devia pensar que me estava a traír! Ah! Como eu detesto gente emocionalmente estúpida...

1 comentário:

Anónimo disse...

FOGO!!!
Até vem mesmo a propósito...

Avalon